Jukebox entrevista — Benjamin Existe
Em meio à pandemia, mixando e produzindo bandas da sua terra, Diego Oliveira conta sobre seu projeto Benjamin Existe.
Se fosse descrever Benjamin — ou melhor dizendo, Diego — eu diria que ele é a personificação dos extremos andando em perfeita harmonia. Fã do heavy metal, iniciou quando adolescente em Vitória da Conquista (BA) uma banda com os amigos da Avenida Lapa. Diego criou Benjamin para aflorar seu lado mais intimista e profundo, que somente a voz e o violão conseguem expressar.
As músicas calmas, e por vezes melancólicas, dançam em harmonia com as letras pesadas. Se engana quem pensa que Benjamin compõe romance, longe disso.
“Embora as músicas falem de aparentemente assuntos mais triviais, relacionamentos românticos, posso te garantir que não tem nada disso lá. As referências são mais obscuras e com um pouquinho de cuidado, analisando as letras, dá pra entender isso”.
Jamais pensou em ser músico, muito menos cantar suas poesias. Da persona Benjamin, autor de poemas sobre experiências da cidade do interior, de reflexões sobre a vida, poesia e autodescoberta em um blog, surgiu o Benjamin em voz e violão. O projeto nasceu de uma conversa entre amigos — a melhor forma de discutir ideias, Diego gosta de ressaltar.
Mas não somente de violão vivem as músicas de Diego. Autodidata, ele aprendeu a tocar sozinho piano, guitarra, contrabaixo e o seu favorito: a bateria, pois “espanta fantasmas”.
“A guitarra, acaba sendo meu instrumento principal também junto com o violão. Talvez porque seja um instrumento que eu reivindique mais esse meu movimento mais agressivo do heavy metal e do rock and roll”.
Desde pequeno ouvia rock and roll, música alternativa e música popular brasileira por influência dos pais, que introduziram bandas como Pink Floyd, Nirvana e Pearl Jam ao seu repertório pessoal. Por ser muito familiarizado com o inglês, optou por escrever e cantar no idioma. Mas isso não quer dizer que Diego não se encante com as poesias de Chico Buarque e com as letras denunciativas de bandas do rock nacional, ele reforça: “elas só não influenciam Benjamin”.
“A minha primeira banda foi uma chamada Reason e era uma banda de som super independente. Mas eu sempre tive esse lado do som mais pesado caminhando em paralelo, e aí curiosamente a primeira banda de heavy metal que eu tive foi um desdobramento dessa banda. Eu e o baixista resolvemos fazer algo mais pesado porque também tínhamos algo pra falar em outros estilos. Curiosamente, tocávamos no porão de uma igreja da cidade”.
“Eu sempre gostei dos extremos”
Algo bem perceptível, tanto na personalidade de Diego, quanto nas poesias musicais que ele produz é essa constante dualidade entre o brando e o pesado colocada à prova em Benjamin Existe. Ele não nega, muito pelo contrário, leva isso como uma das verdades da sua vida. Benjamin também precisou beber um pouco do heavy metal para criar sua estética.
“As músicas do Benjamin são bem dóceis, músicas mais acessíveis sonoramente falando. Elas trabalham em instâncias mais emocionais e estéticas. E aí entra a questão das letras e talvez do meu interesse em cantar em inglês, para que isso não fique tão explícito”.
As referências poéticas do artista vêm de autores como Neruda, Robert Graves, Virginia Woolf, Sylvia Plath, entre outros. Ele mesmo explica que é um processo de ler constantemente esses artistas e “acabar moendo” todos junto às suas experiências e conversas para transformar em poesia.
“Basta uma taça de vinho, um cigarro aceso e uma conversa que parece que você respira, pensa diferente”
Em sua jornada — aqui me refiro a ambas as personas Diego e Benjamin — ele jamais andou sozinho. Durante nossas conversas, ele ressaltou muito as pessoas que estão ao seu lado, sejam as na plateia assistindo suas performances, sejam as que estão por trás das suas produções, não só musicais, mas da vida também.
“Gosto muito de aproveitar meu tempo sozinho, mas nessas instâncias artísticas eu me deixo levar muito e sou muito grato pela interferência alheia e contribuição”.
Foi a partir de uma sugestão do seu amigo, também chamado Diego, que ele resolveu emprestar a sua voz à Benjamin.
“Sem dúvida alguma, eu nunca tinha pensado em assumir a primeira pessoa, como cantor, em um projeto meu. E quando ele [Diego] falou isso parece que tudo fez sentido. Não porque eu tenho a melhor voz do mundo, mas para eu poder deixar claro o que eu queria com aquelas músicas, com os poemas, para as mensagens se fazerem válidas”.
Com o ritmo consonantal do inglês combinando com suas letras, Diego começou a escrever canções pensando na sua voz. O primeiro EP Room, de 2012, composto por sete músicas (que hoje não estão mais disponíveis online) foi fruto de uma noite regada a conhaque e um gravador portátil, e mais tarde foi postado no SoundCloud.
Hoje, a realidade é outra. A partir de Room, ele teve sua primeira viagem a São Paulo, onde morou durante anos trabalhando com produção musical e mixagem. Mais tarde, voltou para a “Suíça baiana”, apelido dado à Vitória da Conquista, do qual Diego discorda veementemente.
“last”: o último álbum lançado
“‘As coisas continuam acontecendo mesmo sem você ter total controle sobre elas’. Isso é meio que uma síntese perfeita de tudo que acredito na vida. Inclusive, isso seria uma forma de explicar o nome do disco ‘Last’. Uma palavra muito forte pra mim no sentido dúbio de ‘durar’ e de ser ‘último’”.
O álbum é composto por dez faixas e, curiosamente, quando questionado sobre quais músicas são especiais para ele, as três mencionadas estão neste disco.
“‘Silent’, primeira música que eu escrevi pro projeto, e é música que as pessoas até hoje me ouvem e chamam na DM para conversar e saber da letra. Ela é, sem dúvida, uma das melhores panorâmicas que eu teria pra explicar a minha temática no geral dentro do Benjamin”.
“Dentro do álbum ‘Last’ também gosto muito de ‘Flutter’ porque ela ressoa bastante entre as pessoas que trabalham com música, com arte no geral. Ela fala sobre esse labor da palavra, nosso papel enquanto artista”.
“E eu acho que a música que finaliza o disco, ‘Collapsed’, ela fecha meio que resumindo a minha opinião geral, digamos assim. Dentro dessa nossa vida cosmopolita moderna tem muito do que eu acredito naquela letra”.
“Estamos vivendo, com certeza, tempos estranhos”
Diego, atualmente, trabalha com mixagens de canções de bandas nacionais, e até mesmo de bandas de fora do país no seu home studio, prática que adotou com o agravamento da pandemia. Em paralelo, ele continua com seu trabalho on demand com a gravadora Som Livre, em que acaba participando de trilhas sonoras de novelas e escrevendo para outros artistas.
“Agora, eu acho que tá sendo bem complicado para muita gente, principalmente para músicos que são muito ligados a tocar na noite, a fazer shows, e que dependem da turnê para levantar a sua grana. Então, para essa galera, eu tenho visto que a coisa tem sido mais vulnerável”.
O Benjamin mais introspectivo precisou ser mais ativo nas redes sociais, inclusive já participou de lives e festivais online, e tem mais eventos agendados até o fim do ano.
“Recebo quase que diariamente pessoas dizendo que minha música tem ajudado nesse período e se sentem em paz ouvindo. Enfim, pensando dessa forma, eu acho que o papel está sendo feito”.
Mas, não foi só a chegada do coronavírus que mudou a forma como o artista tem visto o cenário da música independente.
“A nossa própria posição enquanto artista tem mudado perante essa indústria. A gente precisa encontrar formas novas de se manter relevante e também de continuar tendo interesse e gerando interesse com música, arte no geral”.
Tanto Diego quanto Benjamin têm usado esse período como uma pausa, sem qualquer pressão para se tornar produtivo ou tentar impor esse discurso, como uma forma de carinho e preocupação por quem os acompanha.
Futuro Incerto
Mesmo sem saber quando esse momento delicado vai chegar ao fim, Diego tem planos para um futuro bem próximo em Benjamin Existe, no seu estúdio em Vitória da Conquista. A ideia é ainda se manter na estética minimalista e lançar materiais que ele já tem prontos. Um deles é um álbum de 2016, feito em um momento muito importante da sua vida, o Debrief. O disco foi escrito com Juliana Guinsani, “uma grande parceira de vida e de escrita”.
Ademais, Benjamin pretende relançar seu primeiro disco, o Room, por ter sido uma pedra vital no ínicio da carreira; e também finalizar canções de outro álbum.
“Além disso, estou tentando me manter vivo nesta pandemia. Cuidar das pessoas queridas e das pessoas que eu puder ajudar, para ver se a gente sai disso o quanto antes, para poder tomar uma cerveja na rua em paz”.
OUÇA “SPARK”, UM DOS ÚLTIMOS LANÇAMENTOS DE BENJAMIN EXISTE:
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Sobre a juker:
Júlia Goulart, jornalista, fotógrafa e ex-membro do Jukebox. Fã dos folks e de canções mais calmas, ama ouvir música em qualquer momento do dia e cantar bem alto — mesmo que isso não agrade aos vizinhos.